segunda-feira, novembro 12, 2007

Pé D’água

Por Thiago Berzoini

O tilintar feroz lavando asfalto, as donas-de-casa com seus filhos, apressadas, desejosas por marquises onde possam proteger seus filhos, as donas-de-casa mais prevenidas puxando pelos braços os filhos chorosos pelo clima frio, debaixo de sombrinhas, algumas coloridas outras sóbrias, ansiosas também pelas marquises breves que a cidade oferece, o asfalto sendo lavado pelo tilintar feroz da chuva, nos carros o vidro é lavado, naturalmente, e passam correndo, motoristas que querem o conforto de suas casa, alguns desejam a pele nua da esposa, aquele ali só quer ver a tevê quando chegar e ele aperta o pé, passam apressados, a água, das poças próximas a calçada são jorradas aos transeuntes, a médica de branco molhada com a água suja do asfalto, motorista filho-da-puta, pensa, mais a frente o ponto de ônibus lotado, todos apertados, espremem-se fugindo dos respingos passa o ônibus jorra água do asfalto, sem mãe!, grita o senhor de meia idade tomar no cu, carai!, o boyzinho-do-cordão-de-prata-no-pescoço - que-correu-ali-para-se-esconder-da-chuva grita, sem educação, mas estuda no jesuítas... o caderno cai em meio a movimentação, a madame de salto alto pisa, desculpa, eu não vi!; Oquei..., diz; Porra..., pensa; ele catando do chão o caderno, não tem educação, mas estuda no jesuítas, limpa com nojo o caderno e olha para a praça, um cachorro ensopado arfa parado no meio entre as árvores enquanto água faz brilhar o pelo pardo-amarelado sujo e crispado. O movimento diminui, os carros passam, a hora passa, os ônibus passam, o cachorro deita embaixo de um banco da praça, a chuva diminui, seus pingos estão tímidos. Vai parar...cai mais chuva, Pô, que porra! ele resmunga... Meu pai podia me buscar, vou de táxi, buceta...ele pensa. Não tem educação, mas estuda no jesuítas... ficam todos em um ponto de ônibus, aglomerados, a observar a parede de água caindo dos céus, do executivo do Victory Hotel à servente da creche que tem um caso com um pivete do Dom Bosco, todos unidos no ponto, roçam o terno Armani com a blusa puída exalando suor, o cachorro pulguento esfrega-se na perna nua da menina passando brilho labial, Ai, sai daqui nojento! diz com uma voz insuportavelmente fanha, enquanto seus seus loiros pêlos de súbito eriçam ao cachorro lhe encostar. Ocultos do tilintar da chuva que insiste em molhar ainda assim...(e não... )
Nenhum deles era de açúcar.