quinta-feira, novembro 30, 2006

Pequeno trecho de "Seca"

Thiago Berzoini

"Acordei, bebi dois dedos de café aguado, lavei o rosto com água quente e escurecida que os meninos matreiros, filhos de João Moreno e dona Fofa, nossos vizinhos, trouxeram para minha casa, há dez dias atrás. Coloquei uma roupa velha e calcei minhas desgastadas sandálias de couro, que ganhei do velho fazedor de sandália da região, o seu Muca, falecido já há 4 anos. Vim ter com Zé Aluado. Falamos de como era triste esse calor, e que a chuva se descesse refrescaria e ajudaria na pesca e na plantação. "Estão cortando cana, mas não dá muito dinheiro" resmungou Aluado. Era assim, meio aluado, meio..."zoró", mas tinha razão, não estão pagando muito no corte da cana. Queria voltar a pescar mas nem rio aqui tem. Tenho na memória um dia, quando ainda jovem passeava com Olívia na beira do rio, ela tinha um corpo vistoso, mas anda magra que só vendo, dá até tristeza.
Amei muito Olívia, hoje em dia só sei ter pena. Até teus seios parecem secos, e se os visse hoje não me dariam a água na boca, a sede que me provocavam há 10 anos atrás. Se a vida é lembrança, a vida é tristeza..."

segunda-feira, novembro 27, 2006

Pergunta-se

Thiago Berzoini

E se chegasse minha morte?
Seria o fim ou minha sorte?

terça-feira, novembro 21, 2006

Ai, esses minutos de fama...

Thiago Berzoini

A moto era já velha, não era nem sequer importada. Notava se tratar de um rapaz humilde. Eu me lembro, ainda, e exatamente, seu nome, se é que faz-se importante nesse caso dar “nome aos bois”, como dizem. O que me chamou atenção, e creio eu, deve também chamar a atenção de outras pessoas que assistiram ao ocorrido, era o alto teor alcoólico que o indivíduo se encontrava sob efeito. E é por isso que, inicialmente, conto a seu respeito.
Não conseguia pronunciar uma letra sem arrastá-la verbalmente por menos de 3 segundos. Não, não cronometrei, mas digo isso com a certeza de quem houvera cronometrado. A roupa era uma simples camiseta preta, com alguns dizeres desbotados, e a calça jeans engolia pouco dos pés, que estavam á mostra com chinelo velho que protegia a sola dos pés do rapaz. Sua expressão trazia um riso bobo a quem o olhava, bobo por dois motivos. Era um riso interrompido pois despertava o deboche e o medo por parte de quem o fitava. O deboche, é claro e evidente, pela forma com que sua voz se fazia ouvir, e o medo, devido a apreensão pois embriagado, ele poderia perceber o riso e sentir-se ofendido e o que faria a partir dali poderia tanto ser juntar-se ao riso ou agredir física ou verbalmente quem mantivesse estivesse em sua direção. Ele já havia percorrido alguns quarteirões e a polícia atrás dele. Não sei como conseguiu se locomover sem provocar acidente qualquer, mas conseguiu, mesmo estando naquele estado deplorável. Eram dois os policiais que o abordaram, e o levaram para a delegacia, e lá, o pobre homem tornou-se manchete local. Falava sobre o "cão dos infernos" como quem lhe servia a bebida, não um dono de venda, nem garçom. Era o "cão dos infernos". Mas a voz era arrastada, e o repórter debochava, enquanto fazia suas perguntas. Até o momento que o repórter pediu para que ele cantasse e incompreensível, ele tentou cantar, soava engraçado, realmente hilário. E após isso, cansado de humilhar inda mais o bebum, e provavelmente por ter em mente eu a exposição do homem ao ridículo já fartaria ao público, encerrou o papo com o centro das atenções e voltou-se ao policial que efetuou sua prisão. “Câmera close” no policial, e a música de fundo continuava, a voz oscilante do bêbado soava mais alto ainda, e a música era irreconhecível, não só para mim, acredito fervorosamente que também para os demais que assistiam a isso. O homem da lei ria enquanto falava o que levara o bêbado a ser autuado. Dirigir embriagado, sem carteira, oferecendo riscos aos transeuntes e demais motoristas.
Ocorreu em São Paulo, e fora registrado por um jornal local. O mais surpreendente, entretanto, é ver num belo dia, ao navegar pela rede mundial de computadores, que a reportagem fora ao ar no estrangeiro, em um programa onde se apresentavam “coisas ridículas”, e ver o homem obter seus quinze minutos de fama, agora em solo americano. Não tardou a cair na rede também, onde seus quinze minutos, tornaram-se quinze dias. E até hoje, passado alguns quinze meses, cai-se em alguma página de internet que sustenta o link do tal programa do estrangeiro onde o vídeo pode ser visto, e fico pensando se o rapaz sabe que "é notícia".
Pasmem, o repórter é mero coadjuvante, desses que por melhor que sejam, são sempre coadjuvantes e nada mais. Eles vão sempre se lembrar dele, o bêbado...
Sim, agora percebo, é importante dar “nome aos bois” nesse caso.
Não era um caso digno de matéria em jornal, ainda mais numa cidade grande como São Paulo...houve no dia pauta mais importante e que ficara de fora do noticiário. Não, eu não tenho essa informação concreta, mas posso afirmar com a devoção de quem a tivera apurado.
Me recordo ainda, era Jeremias....porém o nome do repórter, por mais que eu tente, me esforce, puxe com todas as forças possíveis em minha memória, eu não me lembro...

segunda-feira, novembro 13, 2006

Apenas mais uma trincheira

de Thiago Berzoini
Adormecera na trincheira, ao som de balas zunindo e explosões ao longe. Abriu os olhos quando ouviu balbuciar dócil ao longe, e assustou-se. Olhou para os lados e nada viu, a arma estava caída a seu lado, e ele logo a pegou, ajeitando-a, virou-se de bruços e lentamente pôs-se a postos.
Não entendia como havia conseguido adormecer em meio aquele barulho, aquele caos que fora constituído naquele tarde. Era assim a guerra. Verde e mais verde, e toda beleza se esvaía de maneira caótica com o fogo, a pólvora e o sangue. Sim, o sangue. Mas não havia sangue ali. Ele podia perceber corpos por todos os lados, mas não perto de sua trincheira. Lembrava de como caiu no sono. Pensava em uma garota da rua de baixo, que deixara em Ohio. Queria escrever uma carta para ela, quando as coisas se acalmassem. Havia urgência em dizer a ela o quanto ele a desejava, porém nunca o fazia. Tudo era sempre agitado e nunca conseguia ficar traqnuilo para escrever. Mas havia durante a confusão da tarde, colocado em mente que faria isso ao anpoitecer se ainda estivesse vivo quando a noite chegasse. e lá estava ele, vivo. Mas ainda assim não escrevia nada. Procurou papel e caneta, mas só haviam balas, morfina, armas de fogo e brancas, e em seus acessórios nada que pudesse ser usado para escrever, mas sentia necesssidade de enviar logo uma carta para a tal garota. Essa necessidade era maior, crescente a cada minuto, a cada segundo. Depois do que presenciara queria ter a certeza que falaria a ela. Mas mesmo que dissesse ainda haveria um probelma, qual o número da casa dela? ele não sabia...ou não se lembrava. Após alguns minutos pensativo em sua trincheira, lançou ao léu breve sorriso. Poderia anexar a carta "dentro da carta" que escreveria para sua mãe, e ela encarregaria-se de entregar para a tal garota, ele explicaria tudo para sua mãe e ela não se oporia a fazer esse favor ao filho que lutava na guerra.
Mas seus pensamentos foram interrompidos por uma voz infantil que se aproximava. Ergueu com cautela sua cabeça, e viu o garoto se aproximar. "Não mais que cinco anos", pensou o jovem soldado enquanto se aproximava o garotinho. vestia uma bermuda, sem camisa e descalço, seus cabelos estavam despenteados. Sua face a medida que se aproximava, olhando assustado para os lados e os corpos caídos, ficara aparente. estava suja de graxa, as lágrimas desciam juntamente estava assustado, e soluçava bastante. Falava vietnamita. O Soldado não entendeu. Percebendo a tranquilidade ergueu a mão, chamou o garoto.
Provavelmente sem entender nada ele aproximou, com um andar apressado, tropeçou e ameaçou a cair, mas se equilibrou e veio de encontro ao soldado, chorava muito.
Fora da trincheira, despreocupado - pois havia um mórbido silêncio na floresta quebrado apenas pela criança - o soldado caminhou até o garoto, encontrando-o no meio do caminho. Pegou-o no colo e lhe perguntou o que fazia ali, sem pai nem mãe. Não recebera nenhuma resposta. Virou-se de volta à trincheira. "Não é seguro ficarmos aqui" disse ele.
Ouviu um disparo seguido de duas vozes. Suas pernas bambearam e seu peito ardeu como nunca nenhuma dor de amor lhe fez doer.
Caiu de joelhos largando a criança, esta que por sua vez cai ao chão aos prantos, e já sem forças para falar, sussurrou: "Mordi a maldita isca". Mais um disparo ouviu-se em coro com o choro da criança e os gritos que vinham da mata, o jovem soldado sentiu um novo baque, sua cabeça chacoalhou-se de forma brusca, e ele caiu e sem se mexer. Da mata dois homnes saíram, gargalhavam em meio à escuridão.
A criança chorava e engatinhava rumo a trincheira...

sábado, novembro 11, 2006

Palmatória

A duras penas aprendeu o menino:
"o fogo queima,
melhor teu carinho".

quinta-feira, novembro 02, 2006

Galalau Errante

Thiago Berzoini

Lá na estrada é tudo novo.
Tanto passa,
fica velho.
Surpreende agora é o choro,
do menino,
que já é sério.

Desdém

Thiago Berzoini

Não leve a mal
O verso mal feito
Que escrevo.

Leve como um sorriso,
Torto,
De quem não te queria.